terça-feira, 6 de março de 2012

Diferente, mas não é igual?

Um colega, professor titular num Departamento de Matemática, escreveu-me sobre um fato que aconteceu numa reunião de pais e mestres na escola de um filho seu. Uma professora falou da necessidade que os alunos têm de entender que 2x3 é "totalmente diferente" de 3x2.
A mensagem do colega continua: Aí perguntei se eventualmente eles iriam ser ensinados que o resultado dá igual. Os professores tendem a confundir o que eles precisam entender com o que os alunos precisam aprender.
Reconheço que isso acontece mesmo e muito. Mas quem precisa passar essa distinção aos professores de sala de aula, são os formadores que, de dentro da Universidade, se ocupam do Ensino Básico. É uma pena que as Secretarias de Educação, dos Estados e Municípios, não tenham suas próprias equipes com as regalias dos professores da Universidade, que possam participar de Congressos, que possam trazer professores estrangeiros com quem troquem experiências, que disponham de bibliotecas especializadas e de tempo para estudo paralelo às atividades didáticas. É uma pena que os cursos de Licenciatura não tenham um espaço próprio dentro das Universidades, em que a principal preocupação seja a qualidade do ensino básico, ao invés de ficarem “atrelados” aos bacharelados que absorvem maior parte das atenções.
Nem sempre os professores que dão 40 horas-aula, ou mais, por semana, terão condições de analisar e distinguir o que é preciso exigir dos seus alunos e o que é excesso de preciosismo, ou mesmo o “canto de um galo” de local desconhecido.
Fico com pena dessa professora – que talvez nem esteja muito convencida de que 2x3 seja mesmo diferente de 3x2 – ter que ensinar isso aos seus alunos para depois colocar um sinal de = entre eles. Não é por acaso que eles têm dificuldade em compreender tal coisa.
Talvez seja por isso que meus alunos não acreditavam muito no sinal de igual. Eles me perguntavam, com frequência e certa relutância, se podiam substituir, por exemplo, 1/4 por 0,25.
O pior de tudo é que nem acho que 2x3 seja diferente de 3x2. Quando escrevo 2x3 ou 3x2, estou me referindo ao resultado da operação. E, até onde sei, a multiplicação leva ambos os pares (3,2) e (2,3) no número 6. Como diria um carioca legítimo: Né não? 
Disse, lá em cima, que fico com pena dessa professora, pois já encontrei colegas que exercem liderança em Educação Matemática, que fazem questão de distinguir esses 2 produtos (O produto não é o produto? O resultado?).
Claro que somar 3 parcelas iguais a 2 é uma operação e somar 2 parcelas iguais a 3 é outra operação, mas quando se escreve 2+2+2 ou 3+3 ou 2x3 ou 3x2 estamos nos referindo aos resultados que são um só e é por isso que podemos encaixar o sinal de igual entre eles.  
Quando quero conversar com uma criança sobre multiplicação, gosto de olhar para o chão, procurar um retângulo formado por lajotas retangulares do mesmo tamanho, colocar a criança de um e de outro lado, para que ela veja que pode calcular o número total de modos distintos e obter o mesmo valor. 
 
Os professores de sala de aula, aqueles que têm sobre si a responsabilidade de introduzir a criança ou o adolescente ao mundo da Matemática, são bombardeados por questões que só farão sentido em estudos posteriores. São detalhes que não fazem sentido para quem não for adiante e que, mais tarde, se preciso for, serão rapidamente apreendidos numa situação de contraste e com maior maturidade. Por exemplo, a propriedade comutativa da multiplicação vai fazer sentido completo quando o estudante vir uma que não o seja. Por exemplo, quando multiplicar matrizes.
De início, a comparação com a subtração e a divisão, no campo dos números naturais, tem o “pé quebrado”, pois, antes de ter resultados distintos, não é possível comutar - uma delas perde o sentido. Você não pode trocar o 3 com o 9 em 9 – 3 ou em 9 dividido por 3, nos números naturais, porque não é possível calcular 3 – 9 nem 3 dividido por 9. Por isso, não considero muito convincente essa comparação, antes de entrar no campo racional, com números positivos e negativos.
Faço um apelo aos meus colegas da Educação Matemática ou autores de livros que, por acaso, cheguem a este blog: no nível básico, vamos ficar na Matemática que faz sentido! Vamos fazer questão que nossos alunos entendam esse significado e que desenvolvam seu raciocínio com argumentos lógicos encadeados e não com “ordens” cujo significado eles não podem ainda alcançar, por falta de convivência com exemplos significativos ou mesmo, por falta absoluta de necessidade. Vamos escolher temas que dêem mais autonomia ao nosso colega professor da educação básica e não espalhar preconceitos que nada constroem.

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